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Quinta Dimensão

Maestro

Julho 13, 2023

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Tenho mais recordações da infância que do dia de ontem. Talvez porque, em determinada altura da vida, dei por mim a tentar esquecer mais do que queria lembrar. Ainda assim, são memórias com quarenta anos. E, com tanto tempo passado, os fungos da imaginação, ou os engodos da mente, corroem a pureza dos factos, até que as certezas se tornam incertas e as lembranças se esfumam ou se confundem. O que não se esqueceu, funde-se e reconfigura-se com realidades alternativas. Às mãos de uma mente dispersa, a realidade pode ser extremamente porosa ao reino da ficção. Assumo, portanto, que ao procurar lembrar, corro o sério risco de cometer graves imprecisões.

 

Na praceta, protegida pela estátua do Soldado Desconhecido, desaguam quatro caminhos que se encontram num caprichoso cruzamento. O saudosismo da Rua Guerra Junqueiro, que parece extraído das velhas minas de São Pedro da Cova, passa o testemunho à Doutor Severiano que, logo de seguida, o perde na Carvalha. Na perpendicular, a infindável Avenida General Humberto Delgado, que brota do centro de Gondomar, banha o colégio dos Capuchinhos e rende-se, por fim, ao paralelo da Rua do Valado, que aponta ao pavilhão de Hóquei. Do lado direito do Soldado e sob proteção da sua G3, está a decrépita mercearia do Senhor Alberto e da Dona Odete.

 

Antigo casebre mercantil, recebe os escassos clientes, com uma pequena porta e uma breve escadaria. Meia dúzia de passos em frente, sobre um chão avermelhado, oculto por alguma sujidade e muita erosão, um curto balcão em mármore, com a altura da cintura de um adulto médio. Assenta sobre um móvel de madeira comprido, que incrusta uma janela em vidro, para exposição de broa de milho e afins. Na extremidade esquerda, para quem entra, o móvel exibe uma abertura e, sobre ela, a mármore dá lugar a uma espécie de ponte levadiça em madeira, por onde apenas o Sr. Alberto e a D.ª Odete têm permissão de passar. Sobre o mármore assenta uma balança de pratos, de um branco, tão pretérito, que se converteu ao sépia. Ao lado da balança, uma ninhada de pesos enferrujados e, logo a seguir, uma vitrina claustrofóbica, pouco maior que uma caixa de pão. Dentro da caixa de vidro, uma parca variedade de pastéis. Os bolos abrigam-se de um bando de moscas que, desprovidas de mais nobres sentidos, gastam a vida a voar em círculos. Do lado de lá do balcão repousam, guarnecidos por manguitos, os braços lentos do Sr. Alberto, que se juntam aos papéis rabiscados por contas de ocasião e livros razão, com as dívidas dos fregueses que só compram fiado. O velho merceeiro é meu amigo, mas obriga a minha mãe a recordar-me de forma veemente, sempre que me envia a fazer recados, que não quer o troco em rebuçados. Atrás do seu corpo pesado, uma porta de duas abas, encerra todo um manancial de produtos, que se escondem dos olhares de pessoas estranhas ao serviço. Muitos são artigos desconhecidos. Alguns estão esquecidos, debaixo de uns outros, inacessíveis. Só aparecem quando são expressamente pedidos por alguém informado. Outros, ainda, jamais verão a luz do dia. Do lado de cá, à direita da entrada, mais ao fundo, uma montra generosa dá para a rua. Ostenta meia dúzia de brinquedos, cuja cor fora já carcomida pelo Sol e recebe os raios de luz, que se prolongam até uma pequena mesa no canto. A luz alumia-lhe o verniz estalado que, à vista desarmada, falhou em proteger os veios e os nós da madeira. Um pequeno banco manco, que se esconde sob a mesa, é o lugar cativo que, todos os dias úteis das semanas inúteis, é religiosamente reclamado pelo Serra.

 

Serra, só de nome, porque é um homem de estatura média e aspeto franzino. Deve ter os seus 50, mas os problemas de saúde fazem com que pareça mais velho. Dizem que só tem um pulmão e que, por estar tão dependente da bebida, um dia apanhou uma congestão por beber água. Mas o povo é um pródigo criativo, capaz de inventar merdas que não lembra ao diabo. Veste uma gabardina leve, bege, que lhe confere um ar de inspetor. Os óculos, com lentes garrafais, elevam-no a um patamar de intelectualidade, apenas desfeito por lamentos entre goladas de Aldeia Velha. Uma boina, em bombazina, num padrão de quadrados e matiz castanhos, completa a indumentária e dá-lhe uma certa altivez, uma nobreza intrínseca que emana dos perdidos. A memória não permite que me recorde de uma única palavra que o Serra tenha dito, mas guardo-o, para mim, como um poeta. Não esqueço que tolerava e simpatizava com um pirralho travesso e, do pouco que conheci, parecia ser um homem bom, possivelmente com boas palavras.

 

Mais ou menos a meio, o pequeno copo de bagaço exibe uma ténue linha azul, possivelmente com o intuito de recomendar uma dose que não deve ser excedida. A recomendação não passa disso mesmo e, depois de alguns copos excedentários, o Serra sai da mercearia. Com a coragem de um comandante, que é enviado para a guerra, apodera-se do cruzamento e assume uma postura sóbria e autoritária. Levanta a palma da mão direita e faz com que os carros, que vêm da avenida, parem e formem uma fila. Com o outro braço, incentiva o troleicarro, de dois andares, a subir a Guerra Junqueiro. Desengonçado e com as hastes bamboleantes, o pesado de passageiros, agarra-se, como pode, aos cabos aéreos que traçam o caminho. A corrente elétrica impulsiona a besta e, esta, faz o que lhe mandam. Passam, também, um par de carros que seguem logo atrás, até que, aos restantes, é-lhes ordenado que parem. Depois as outras ruas, até que, por fim, cede à pressão das buzinas dos condutores impacientes que aguardam na avenida. Repete alguns ciclos e consegue uma surpreendente fluidez na circulação do cruzamento. Passados uns minutos, já com alguns escudos no bolso, volta à mesa da mercearia. Senta-se no banco e, enquanto conversa com o Sr. Alberto, observa o pequeno cálice. A aguardente jorra da garrafa e afoga a ténue linha azul.

 

Nunca percebi como conseguia que todos os condutores o respeitassem. Como conseguiu dominar as feras que possuem os veículos e os submetem à selva das estradas. E como eu invejava o trabalho de sinaleiro que o Serra tão bem fazia… Ao longo dos anos, o cruzamento foi alvo de vários acidentes, mas – ficção ou realidade – não me lembro de um único com o Serra a orquestrar o trânsito.

Escravo da Moda

Junho 14, 2023

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Depois do “milagre” da multiplicação de visualizações, voltamos à normalidade. Creio que Deus leva a sério as questões do livre arbítrio e amor infinito, porque acabou por não me vaporizar antes que pudesse escrever o que escrevi. Ainda assim, mesmo sendo omnisciente, suponho que não se importou de abraçar o engodo que lhe lancei e fez questão de afastar as visualizações para ninguém ler. Desse modo, ambos ficamos felizes. Eu, porque volto ao reconfortante vazio da minha “casa” e Ele, porque teve uma atitude bondosa, ao poupar as pessoas de perda de tempo e sofrimento desnecessário.

Ao mergulhar na história do blog, encetei, num fôlego, uma espécie de viagem ao passado. Foi suficiente para perceber que algo mudou. Não me lembro do porquê, mas, a determinada altura (ou fundura) da minha vida, senti a necessidade da adotar um poema que me identificasse. Apenas, claro, para exercício e consumo interno. O primeiro poema a que recorri foi, com alguma naturalidade, “Amador sem Coisa Amada” de António Gedeão. Mais tarde, na lonjura das noites, procurei personalizar algo que me caracterizasse um pouco melhor. Algo que me identificasse e servisse como uma espécie de fato à medida. Não me importei de passar da seda do fato de Gedeão, para a ganga rota e serapilheira desbotada das palavras que cozi. Quis arriscar e cair dentro do poço que bebe de mim. Esse ensaio de poema serviu durante largos tempos, mas creio que já não me assenta. Começo a sentir-me uma espécie de rei vai nu.

Ainda que o monge comece por tecer o hábito, tantas vezes o hábito acaba a fazer o monge. Não quero obedecer nem, tão-pouco, fazer fretes a poemas. Não sei quem sou, mas, ali, já não sou eu. Mais ou menos na época em que escrevi o “Sombra Lunar”, escrevi o poema que, acredito, hoje me cai melhor. Hoje dispo as vestes rasgadas e visto o “Poema Invisível”.

 

 

Amador sem Coisa Amada – Poema de António Gedeão

"

Resolvi andar na rua

com os olhos postos no chão.

Quem me quiser que me chame

ou que me toque com a mão.

 

Quando a angústia embaciar

de tédio os olhos vidrados,

olharei para os prédios altos,

para as telhas dos telhados.

 

Amador sem coisa amada,

aprendiz colegial.

Sou amador da existência,

não chego a profissional.

"

 

Sombra Lunar

"

Parece-me, de noite, ver alguém na Lua,

solitário e prisioneiro do seu lado oculto.

Parece navegar as cinzas numa falua

e arrastar-se no sedimento como um vulto.

 

Existirão seres extraterrestres,

ou será apenas a névoa do meu olhar cansado?

Talvez só chamando cientistas e mestres,

para vencer as crenças e os dogmas do passado.

 

O mais certo é estar aluado,

desgostoso pela gravidade do espaço.

Triste e despedaçado por não ser amado

e ansioso por me deitar num regaço.

 

Mas não!

Não estou louco nem estafado,

muito embora haja quem diz o contrário.

É que não é fácil ludibriar o fado:

lá em cima só eu e este pobre diário.

"

 

Poema Invisível

" "

Queda para cair

Junho 09, 2023

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Qualquer um pode cair, mas nem todos se levantam. Há quedas que matam ou invalidam. Se nos roubam a vida, nada mais há. Terminamos com a morte. Aqui, neste ponto final.

Se continuamos, é porque não morremos. Não desta vez. Ainda assim, se for mais que uma ilusão, será apenas uma questão de tempo. Mas poderá não ser melhor. Há quedas que amputam a autonomia. De tal forma amordaçam a liberdade do espírito que, este, se lhe sobra alguma consciência, lamenta cada letra deste paragrafo a que chegou.

Se ainda continuamos, é porque não estamos inconscientes e usufruímos de resquícios de vida. De alguma forma, encontramos motivos ou inventamos forças para quebrar a descontinuidade. Seguramente estamos fragilizados e, possivelmente, tornamo-nos em algo que não somos. Tudo é incerto, mas, por pequena que seja, a pitada de vida pode germinar e dar qualquer coisa. As expectativas, porém, não devem ser mais que nenhumas.

Querendo continuar, mesmo que sem certezas e a medo, é porque somos loucos ou masoquistas. Ou ambos. Talvez, a condição de mortal, imponha uma certa dose de loucura e capacidade de sofrimento, a quem estiver disposto a aceita-la. Podemos, claro, recusar a dádiva. Mas, se não a recusamos, aceitamo-la, mesmo que de forma tácita.

O divórcio amputou-me um órgão que batia no peito. No seu lugar, talvez por feitiçaria das leis de Darwin, nasceu algo como um punho fechado. Bate-me várias vezes por minuto, muitas vezes ao dia. Agride-me tantas vezes à noite. Ontem, por causa da nossa filha, falamos. Custa-me dizer, porque abana com a autoestima e o pouco orgulho tolo que ainda tinha. Custa-me dizer, mas a verdade crua é a única lanterna que preservo no seio das trevas. Custa-me dizer, mas o divórcio fez bem a quem amei e mal a quem nunca amei.

Cair é muito fácil. Levantarmo-nos, nem tanto. Cair é rápido. Levantarmo-nos, costuma ser um processo mais complexo e demorado. Qualquer um pode cair e pode não ter a oportunidade de se levantar. Mas, havendo oportunidade, por insignificante que seja, a forma como nos levantamos, poderá ser o que nos define, ou aquilo que queremos que nos defina.

O facto de ter sido trocado não ajuda, mas como me posso amar se apenas emano covardia e estupidez. Sempre tive medo de cair. Toda a vida, a tentar evitar quedas. Há quedas que não podem ser antecipadas. Outras até podem, mas não as evitamos, porque somos ingénuos ou deambulamos, distraídos, no abismo. Talvez um dia me consiga perdoar e, quem sabe, amar. Talvez, se conseguir trocar o medo de cair, pela coragem de procurar melhores maneiras de me levantar.

Almoço de Domingo

Março 19, 2023

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Tive, no ano de 2017, a feliz oportunidade de, em trabalho, visitar Angola.
Lembro-me de, no final das refeições, imaginar viagens entre o continente Africano e Portugal.
O cheiro do café, que recordava a distância de casa, e os goles, na chávena escaldada, que encurtavam a saudade.
A nostalgia de, noutro mundo, beijar a espuma de um expresso tão português.


No ano passado, surgiu a oportunidade de ler o romance biográfico do Dr. Rui Nabeiro, escrito por José Luís Peixoto.
Pude conhecer, entre as paisagens da História e de Campo Maior, um pouco mais sobre as origens e a vida do Comendador e da Delta Cafés.


Hoje, o "Almoço de Domingo" ficou mais pobre.

A Casa dos Gatos

Fevereiro 23, 2023

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Do outro lado da rua, o velho casebre - a que chamamos a casa dos gatos - teima em não se render à condenação do tempo. O mesmo não se pode dizer dos gatos que lá moravam e acabaram por sucumbir na espuma dos dias. Restam apenas algumas ténues memórias que se esbatem na bruma do esquecimento. Lembranças que surgem, como a acidez do estômago, e desaguam na boca um travo amargo.

 

Estávamos no ano de 2010 e tínhamos - eu e a minha esposa - acabado de nos mudar para um anónimo 2º andar direito de um dormitório do Porto. Era uma época entusiasmante e de esperanças renovadas. Uma miragem para um novo futuro com novas possibilidades.

 

Iniciávamos as primícias de uma noite de verão e, da varanda das traseiras, que fica por cima do acesso às garagens, ouve-se uma espécie de sirene. Era demasiado desafinada e inconstante para ser algo mecânico. Um som ininterrupto e incomodativo, de tal forma que acaba por me conduzir a indagar o motivo da desarmonia. Espreito para baixo e, junto ao solo, entre os quadrados formados pelas linhas no cimento, um gato amarelo perfila-se a reivindicar veementemente uma qualquer coisa. Pela minha parca experiência concluí que, por vezes não importa muito o que se reivindica, porque o ato de reivindicar, por si só, pode ser uma verdadeira arte. E o bicho era, indubitavelmente, um artista. Tinha algo de exótico e abstrato que, com uma pincelada lírica, posso descrever como “uma certa pinta”. Ainda assim, e voltando ao que importa, não mostrava sinais de querer abrandar a contenda. Os nossos olhares cruzam-se e, nesse instante, o protesto parece agravar-se e torna-se pessoal. Não sei o que pensar, mas assumo o desafio e decido lançar-lhe uns fiapos de carne que sobraram do jantar. Ato consumado, após alguns lançamentos, os decibéis foram esmorecendo e o gato acabou, finalmente, por regressar à habitual vadiagem das ruas. Na noite seguinte e albergando o seu misterioso carisma, o processo repetiu-se. E na noite seguinte... e nas noites seguintes, até se tornar um hábito. Foi assim que conheci o gato amarelo e, como tenho uma imaginação prodigiosa, batizei-o de “Gato Amarelo”.

 

De quando em vez alterava a rotina, descia e deixava-lhe uma taça com ração a que ele só acedia quando me via longe. Nalguns dias, porém, a fome crescia mais que o medo e os seus critérios relativos a distâncias de segurança tornaram-se, gradualmente, mais flexíveis. Tanto que um dia - já haviam passado meses desde o primeiro contacto - consegui colocar-lhe a mão, provocando-lhe uma reação de choque que o catapultou numa espécie de salto quântico. Apesar do valente susto, nas semanas seguintes encarnou a raposa de Saint-Exupéry e, para além de comida, procurava um afago no pelo. O gato era esperto e aprendeu a reconhecer o som do carro. Assim que estacionava, após um dia de trabalho, ele emergia das ruínas da casa. Pelo menos até ao dia em que troquei de carro e tivemos que criar um novo sistema de comunicações. Não sei ao certo como começou mas, assim que chegava do trabalho, chocalhava o molho de chaves que transporto no bolso e ele aparecia. Trazia, por vezes, uma ou outra gata para o jantar mas, inevitavelmente, com o tempo - cedo ou mais tarde - desapareciam ou morriam. Desde os atropelamentos, aos envenenamentos, ataques de cães ou de outros gatos, as doenças, até às intempéries ou às noites em que o frio corrói os ossos. Não é fácil a vida de vira-lata. Houve dias a fio em que, também ele, não aparecia e o chocalhar das chaves não tinha a magia para abrir o portal do Universo da casa dos gatos.

 

Em 2014 a minha filha nasceu. Depois, com dois anos e esporadicamente, ia comigo até à garagem e, juntos, levávamos ração ao Amarelo. A Matilde achava-lhe piada e tentava agarra-lo pela cauda, obrigando-o a praticar manobras evasivas e exercícios de tolerância. Os anos foram passando e houve momentos – poucos - em que aparecia mais amolgado pelas contingências da vida. Nessas alturas, como um traidor, capturava-o e levava-o à veterinária da minha gata. Era resiliente e recuperava sempre para, de novo, voltar às ruas. Num desses momentos experimentei leva-lo para casa mas a sua identidade estava refém das ruínas e era mais forte que o conforto de quatro paredes e um teto. Deixei-o ir.

 

Passados mais uns anos, em que também eu não estava na melhor fase da vida, começou a adoecer e a aparecer com menos regularidade. Até que um dia, enquanto passeava com a Matilde, veio ter connosco, visivelmente debilitado. De uma forma displicente, amaciei-lhe o pelo e continuamos. Hoje, creio, foi a forma de se despedir. Desde esse instante, nunca mais o vi. Há portas que se fecham e nenhuma chave consegue abrir. Hoje embriago-me de melancolia porque não são apenas as ruínas da casa dos gatos que estão vazias. Pouco tempo depois estava a iniciar o processo de divórcio e a pandemia dava os primeiros sinais de que seria algo sério.

 

Deste lado da rua, teimo em não me render à condenação do tempo.

Boas Festas!

Dezembro 20, 2022

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A Fava
(poema de Vasco Graça Moura)

espero que me calhe aquela fava
que é costume meter no bolo-rei:
quer dizer que o comi, que o partilhei
no natal com quem mais o partilhava

numa ordem das coisas cuja lei
de afectos e memória em nós se grava
nalgum lugar da alma e que destrava
tanta coisa sumida que, bem sei,

pela sua presença cristaliza
saudade e alegria em sons e brilhos,
sabores, cores, luzes, estribilhos...
e até por quem nos falta então se irisa

na mais pobre semente a intensa dança
de tempo adulto e tempo de criança.

Ontem Poesia, Hoje Prosa

Fevereiro 09, 2022

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Estávamos no início de 2013. A minha cabeça procurava, dentro da azáfama, pequenos momentos de solidão. Precisava de pensar e procurar condensar, em poucas palavras, a magia daquele dia. Queria tornar o nosso casamento ainda mais especial e que te sentisses a mais especial. Queria criar uma memória que nos unisse para sempre.

Enquanto falava e sorria, sem que ninguém suspeitasse, uma parte de mim ausentou-se. Desajeitadamente, procurava atar emoções esbaforidas a um anzol enferrujado de pensamentos. As palavras, contudo, não mordiam e a faina não terá sido a melhor. A pressão e o medo de não estar à altura do momento eram esmagadores e, como sabes, sempre tive a propensão para falhar nos momentos realmente importantes.

Levantamos as taças de champanhe e o esquisso que, em pânico rabisquei na mente, ganhou corpo nas palavras arranhadas pelo som da minha voz:

"Nem todos os poemas têm rimas e nem todas as rimas são poesia.
Mas a pessoa, ao meu lado, é o poema da minha vida."

Coramos, rimos e bebemos ao "Felizes para sempre".

...

Hoje. Lado a lado, separados pela prosa fria dos papéis do divórcio. Fim.

Sons da Escrita

Outubro 12, 2021

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O Professor José António Moreira foi o responsável por aquele que considero o melhor audioblog português.
Fui apenas um dos muitos seguidores, a quem o projeto e a excecional pessoa, deixaram saudades e a sensação de perda irreparável.
Deixo uma humilde e tardia homenagem.
Deixo que o silêncio vítreo do passado seja, agora, quebrado pela memória do "Sons da Escrita":

 

https://www.tsf.pt/programa/radiocom/emissao/sons-da-escrita-892117.html

Quinta Dimensão

Setembro 17, 2021

Se desconsiderarmos o preto e o branco, a vida tem episódios sem cor.

 

Lembro-me de, em criança, aguardar - com crescente ansiedade - pela hora em que a Quinta Dimensão expandia os limites bidimensionais da velha televisão.

 

Passou muito tempo e as lembranças fundem-se com esquecimentos. O cérebro procura acompanhar a velocidade dos dias e, por vezes, quando precisa de espaço, liberta aquilo que considera lastro: decrépitas memórias sem real utilidade prática. Fica uma espécie de névoa crepuscular, que se adensa com a distância do passado. O cérebro não tem coração.

 

Tudo isto pode ser um devaneio mas também pode ser “The Twilight Zone”.

 

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Não Vais Morrer

Janeiro 10, 2021

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O meu avô paterno tinha os seus defeitos, mas isso não importa porque era meu amigo.

Vivíamos na mesma casa: eu, os meus pais e os pais do meu pai. O meu avô estava aposentado devido a problemas de saúde provocados pelo pó das minas. Mas, como se não bastasse, para além de ter sido mineiro, era um fumador convicto.

Uma noite, por volta dos meus cinco anos, lembro-me de estar na cozinha com os meus avós e pai. Devia estar a brincar enquanto falavam de algo relacionado com o resultado de uns exames que o meu avô fizera aos pulmões. Apesar de não prestar atenção ao que era dito, o tom acelerado da conversa provocava-me uma crescente ansiedade. Por fim o meu pai, dirigindo-se ao meu avô, disse num tom frio e imperativo:

- Pai, você vai morrer!

Não me recordo do que foi dito até então nem, tão-pouco, do que foi dito após. Apenas essa frase seca. Nunca, até aquele momento, tinha sentido dentro de mim e à minha volta, um tão grande vazio. Vejo o meu avô retirar-se, cabisbaixo e solitário, na direção do quarto. Naquele momento surreal creio que tomei uma das decisões mais importantes da minha vida e fui ter com ele para ser seu amigo.

Estava deitado na cama, barriga para cima, ausente nos seus pensamentos. Sentei-me em cima dele. O meu pai sempre primara pelo egoísmo e pela ausência e, essa ausência, era-me disfarçada pela nobreza do meu avô. Não sabia o que fazer ou dizer para que se sentisse melhor. Para eu próprio me sentir melhor. Mas, passado algum tempo e enquanto brincava com o seu relógio de pulso, acabei por sussurrar-lhe:

- Avô, tu não vais morrer.

Passado muito pouco tempo, adoeceu seriamente. Passou por um sofrimento atroz de modo que fantasmas o afastaram da realidade e deixou de nos conhecer. Lembro-me de o ver contorcer-se com dores e da dor que era olharmo-nos sem nos vermos. Morreu poucos meses depois.

A vida – ou a morte – encerra curiosidades, algumas tristes. Enquanto brincava com o seu relógio e lhe dizia que não ia morrer... O tempo e a morte já o reclamavam. Hoje, quando me dizem que vai tudo ficar bem, digo que sim, mas não acredito muito. Quando digo a alguém que vai tudo ficar bem... bem, talvez hipocritamente, acredito pouco.

Mas a vida abre curiosidades, algumas menos tristes. Enquanto brincava com o seu relógio e lhe dizia que não ia morrer... Passados este anos todos, o meu avô está vivo: nestas palavras, nesta saudade. Neste peito.

Memo

Janeiro 08, 2021

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As memórias são sombras da sombra do que fomos.

São vultos que se esfumam na bruma do esquecimento.

E, por cada memória que guardei, quantas perdi?

Algumas escondem-se de mim. Outras, escondo-me delas.

Algumas enganam-me.

Lembro-me de, em criança, escalar uma estátua de bronze.

Não compreendia o seu significado e não a respeitava.

Lembranças de infância, cada vez mais baças e confusas.

Lembranças que vou esquecendo. Pedaços de mim que perdi.

E, com tantas perdas, já se faz tarde sem que me descubra, mas...

Se me lembrasse de quem sou, seria eu.

Hoje sinto-me uma liga de cobre estranho.

Longe de ser herói, sinto-me perdido na estátua:

O Soldado Desconhecido.

Falta ( não é futebol ).

Junho 25, 2012

Tantos blogs que morreram. Ou definham num modo de morrer interminável. Pedaços de sentimentos, congelados na aridez de um deserto de tempo perdido. Tanto de tanta gente que um servidor, teimosa e automáticamente, guarda e faz permanecer através desta ridícula, ilusória e brevíssima eternidade. Criações abandonadas pelos criadores.

 

Estou a ver blogs antigos e soa-me como se de navios fantasma se tratasse. Vagueiam num mar infinito, titânico. Navegam o esquecimento. Sinto o gelo da solidão ao reparar nas últimas datas, detidas e atoladas num passado longínquo, fúngico e bastante pastoso. Sinto a falta do calor humano, das cores dos sentimentos recentes, do escorregar das lágrimas e do bálsamo dos sorrisos. Sinto falta dos desabafos verdadeiros e dos sonhos inocentes, das realidades enganadas. Sinto a ausência dos olhos, que banhavam as letras com a suave esponja da atenção. Sinto a falta dos comentários que seduziam os textos com novas e refrescantes perspectivas.

 

Sinto a falta de uma parte de mim que viaja com todos aqueles que conheci.

 

Não é que queira voltar ao passado mas, hoje...

Sinto a falta do tudo, perante este nada.

Sombra Lunar

Abril 11, 2012

Parece-me, de noite, ver alguém na Lua,

solitário e prisioneiro do seu lado oculto.

Parece navegar as cinzas numa falua

e arrastar-se no sedimento como um vulto.

 

Existirão seres extraterrestres,

ou será apenas a névoa do meu olhar cansado?

Talvez só chamando cientistas e mestres,

para vencer as crenças e os dogmas do passado.

 

O mais certo é estar aluado,

desgostoso pela gravidade do espaço.

Triste e despedaçado por não ser amado

e ansioso por me deitar num regaço.

 

Mas não!

Não estou louco nem estafado,

muito embora haja quem diz o contrário.

É que não é fácil ludibriar o fado:

lá em cima só eu e este pobre diário.

Correntes Invisíveis

Julho 03, 2007

(imagem retirada da internet)

 
Meio da tarde. O tempo está deprimido: cinzento, tal qual o meu casaco. No alto planam algumas gaivotas. Aproveitam correntes de rios de vento que, para mim, são invisíveis mas, para as aves, marujos experientes, são dádivas que não escapam ao instinto. Parecem voar sem destino, sem mapa e sem instrumentos, apenas pelo prazer de navegar os céus.
 
Atentamente,
ejail.

Ănima

Junho 27, 2007

(imagem retirada da internet)
Nasci no Porto e, nas minhas veias, corre sangue com granito. Carmesim, escurecido com cinza deslavada: é este o líquido que me sustém o esqueleto de pé. Respiro pesadamente como se, a cada acção de inspirar, correspondesse o acto de erguer uma fraga. É uma falta de ar que advém da poluição dos pensamentos estéreis que, em mim, se esfumam sem nunca se materializarem. É uma respiração comprimida que se aperta contra o peito, com uma veemência e um vigor desproporcionados. Um aperto voraz, contra um peito disforme que oculta um coração maciço de pedra-pomes. Este órgão estranho, monolítico — que um dia foi um pedaço de lava, de magma incandescente e pleno de actividade e de vida — é hoje um velho ajuntamento, disperso e compacto, de cinzas carbonizadas. Tudo em mim, portuense, parece desprovido de vitalidade. Tudo parece disposto num pós-incêndio: cinzento, desordenado e constante. Tudo em mim parece um bando de formas indissociáveis: uma argamassa insípida e de monótona destruição. Tudo, neste instante de melancolia, parece morto… excepto:
 
a Alma.

Sinto Absinto

Junho 20, 2007

Hoje apetece-me morrer. Mas, tirando isso, estou óptimo. Não é que me apeteça suicidar nem coisa do género. O suicídio, por si só, parece-me ser demasiado abstracto e elanguescente para acalmar tanta dor. Está, portanto, fora de questão e terá de ser algo bem mais contundente. É difícil, no entanto, quantificar a dor que sinto. Mas, a Matemática, é algo de extraordinário e diz que a definição de medir é, nada mais, que comparar. Portanto, para ser possível perceber o quanto é anedótico o suicídio, como analgésico para a agonia que me desmembra, basta dizer que é como tomar um ramo de salsa para aliviar a super-dor da amputação selvática do coração. Bendita Matemática, que é uma luz clarividente que contrasta com a cegueira da humanidade. Mas, apesar da ajuda da Matemática, o problema de fundo persiste: encontrar um processo mais mórbido que o suicídio.
Chego ao fim do dia cansado. Faço um grande esforço, a toda a hora, para me manter vivo. E, depois, chega a noite e as coisas não melhoram. Pouso, pesarosamente, a cabeça estéril sobre a travesseira curada pelo sal das lágrimas e cerro os olhos. Tento adormecer mas, o único estado que consigo atingir, é sentir-me definhar, a morrer. Porém, na manhã seguinte, acabo sempre magoado por mais um despertar. É um ciclo solitário, escuro e asmático. De uma humidade espiritual e fantasmagórica que deforma os ossos. Não são sentimentos de circunstância, há razões para tanta angústia! Genéticas? Também, com certeza. Mas não só:
Nunca amei tanto alguém, como aquela mulher. E nunca alguém me fez tão mal como ela. Quando menos espero, eis que a crueldade gélida do seu machado me dilacera, uma vez mais, o peito flácido. Nunca mais vou conseguir confiar e nunca mais vou conseguir amar alguém. Nunca mais! Amputaram-me o coração e o que bate no lado esquerdo da cavidade torácica é apenas medo. Medo do mais puro, do mais vergonhoso, do mais cobarde. Um medo constante de voltar a sofrer uma dor que não suporto. Não consigo compreender o porquê de tanto mal, para uma pessoa que lhe fez tão bem? Hoje precisava dos braços emprestados de alguém. Precisava de uma mulher que me sussurrasse ao ouvido que não sou lixo, pois é como me sinto. Mas isso já são devaneios e é importante manter os pés na terra, e não perder a noção da realidade. Ainda assim, nem tudo está perdido porque, pelo menos, em todo este processo, consegui descobrir algo muito pior que o suicídio: o amor.
(imagem retirada da internet)
Atentamente,
José.

Talvez a questão não seja “se eu acredito em Deus?”, mas “se Deus acredita em mim?”

Junho 19, 2007

E se hoje eu acreditar em Deus? E se Deus chegasse à minha beira e, ao contrário do que é habitual, fosse Ele a pedir-me ajuda? E se Deus dissesse que se sente só, está deprimido e inconsolável? Se me dissesse que não consegue fazer nada de jeito? Se dissesse que tudo o que criou está destruído e não tem conserto? Se, em lágrimas, Deus me suplicasse por ajuda? Se dissesse que só queria morrer mas não pode, porque a sua condição de imortal não Lho permite?
(imagem retirada da internet)
O que diria eu a Deus? Será que eu O quereria ajudar?..
 
Atentamente,
ejail.

Palavra Amiga

Junho 11, 2007

Tardo em tingir a folha branca de nódoas negras. A raiva impele-me a recorrer à riqueza do calão para espancar a folha com as mais violentas palavras. Talvez isso me faça sentir menos mal… mas não há meio de o saber, porque não consigo. De resto, a impotência é uma palavra cada vez mais presente na minha vida. Hoje a solidão é diferente pois, até as palavras me abandonaram, e o próprio branco da folha é demasiado nítido. E é um branco tão obstinado que quase obriga os meus olhos a quererem cegar.
 
Sinto-me mal... Durante uma conversa, ao telemóvel, queria dizer tantas coisas e não consegui dizer nada. As palavras evaporavam-se como mercúrio ao sol. Apercebi-me de que estava completamente vazio e que nada mais tenho para oferecer. Dantes ainda encontrava uma palavra amiga mas, agora… nem isso consigo descobrir dentro de mim. Sinto-me completamente oco e inútil e, a cada dia que passa, o sentimento agrava-se…
 
Gostava de poder dizer “abracadabra” e, com essa palavra, enxugar as tuas lágrimas frias e desenhar-te um sorriso genuíno no rosto… mas falta-me a magia. Sou feito de apenas poeira e, em mim, não há quaisquer partículas de luz. Desculpa Gabi… tu és uma pessoa "one in a million" e mereces, claramente, um amigo muito melhor do que eu…
 
Um caloroso abraço,
do teu José.

Poema Invisível

Junho 03, 2007

Uma vez escrevi um poema a que dei o nome de Poema Invisível. Não tinha palavras e foi, talvez, o poema mais puro que alguma vez escrevi ou escreverei. Foi escrito apenas com sentimentos. Sentimentos tão profundos que as palavras não podem tocar…
 
Sempre que olho para aquele poema sinto vontade de chorar e as lágrimas servem como lentes para eu conseguir ler os hieróglifos dissimulados. Ninguém mais consegue saber o que lá está porque só as minhas lágrimas sabem o que escrevi. Só elas têm a graduação correcta e todas as outras pessoas vêm uma folha em branco.
(imagem retirada da internet)
Hoje estou triste como a noite e não consigo falar dos motivos. Nem tão pouco os consigo entender. Daqui para a frente, tudo o que está escrito neste post é invisível… excepto para mim… porque as lágrimas são bem reais:

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