Anti-histamínicos
Abril 17, 2023
Tenho andado com alergias. Não sei porque escrevo este texto, mas é possível que não esteja totalmente em mim. Suponho que a inalação de pó de pinheiro terá ultrapassado a dose de segurança recomendada pela OMS e me possa encontrar sob efeito de algum desequilíbrio hormonal.
No livro de Génesis, Deus proibiu o ser humano de comer o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal.
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A serpente, que era o mais astuto de todos os animais selvagens criados pelo Senhor Deus, disse à mulher: «Com que então Deus proibiu-vos de comerem do fruto de todas as árvores do jardim!»
Mas a mulher respondeu-lhe: «Nós podemos comer o fruto das árvores do jardim. Só nos proibiu de comer do fruto da árvore que está no meio do jardim. Se tocássemos no seu fruto, morreríamos.»
A serpente replicou-lhe: «Não têm que morrer. De maneira nenhuma! O que acontece é que Deus sabe que no dia em que comerem desse fruto, abrir-se-ão os vossos olhos e ficarão a conhecer o mal e o bem, tal como Deus.»
A mulher pensou então que devia ser bom comer do fruto daquela árvore, que era apetitoso e agradável à vista e útil para alcançar sabedoria. Apanhou-o, comeu e deu ao seu marido que comeu também.
Nesse momento, abriram-se os olhos de ambos e deram-se conta de que andavam nus. Coseram então folhas de figueira, para com elas poderem cobrir a cintura.
Nisto ouviram que o Senhor Deus andava a passear no jardim, pela brisa da tarde, e o homem foi-se esconder com a sua mulher no meio das árvores do jardim.
O Senhor Deus chamou pelo homem e perguntou: «Onde estás?»
O homem respondeu: «Apercebi-me de que andavas no jardim; tive medo, por estar nu, e escondi-me.»
Deus perguntou-lhe: «Quem é que te disse que estavas nu? Será que foste comer do fruto daquela árvore que eu tinha proibido?»
O homem replicou: «A mulher que me deste para viver comigo é que me deu do fruto dessa árvore e eu comi.»
O Senhor Deus disse então à mulher: «Que é que fizeste?»
A mulher respondeu: «A serpente enganou-me e eu comi.»
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Na antiguidade, em especial na mitologia grega, a serpente era tida como representante da sabedoria. É interessante verificar que foi a serpente - aqui confirmada como o mais astuto de todos os animais selvagens - que seduziu a mulher a abrir os olhos ao conhecimento. A mulher, desejosa por sabedoria, ousou quebrar as regras e partilhou a sua descoberta com o homem. Depois é o que se conhece. Ao longo da história assistimos a guerras, longas e sangrentas, entre religião e ciência. Assistimos, por parte de muitas religiões, a uma diabolização da mulher e até das próprias serpentes. Gostaria, no entanto, de retirar algumas notas sobre este equívoco milenar:
- Deus - que tudo sabe - saberia, enquanto Pai, que quando proibimos um filho de fazer algo, deparamo-nos com uma taxa de insucesso extremamente elevada. Fica a questão: Poderá Deus ter agido de forma premeditada?
- Quando Adão e Eva se deram conta de que andavam nus e coseram folhas de figueira para cobrirem a cintura, estavam ˗ na minha humilde opinião ˗ a dar os primeiros passos naquela que viria a ser a bilionária indústria da moda.
- Interessante notar que, quando Deus foi pedir responsabilidades, o homem culpou a mulher e a mulher culpou a serpente. Este padrão de assobiar para o lado e passar de responsabilidades não acontece apenas nas Comissões Parlamentares de Inquérito.
Por fim, gostaria de invocar o poeta "Charles Baudelaire" e o seu poema "A serpente que dança".
Para muitos homens será pecado. Para Deus, creio, será divino:
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Em teu corpo, lânguida amante,
Me apraz contemplar,
Como um tecido vacilante,
A pele a faiscar.
Em tua fluida cabeleira
De ácidos perfumes,
Onde olorosa e aventureira
De azulados gumes,
Como um navio que amanhece
Mal desponta o vento,
Minha alma em sonho se oferece
Rumo ao firmamento
Teus olhos que jamais traduzem
Rancor ou doçura,
São joias frias onde luzem
O ouro e a gema impura.
Ao ver-te a cadência indolente,
Bela de exaustão,
Dir-se-á que dança uma serpente
No alto de um bastão.
Ébria de preguiça infinita,
A fronte de infanta
Se inclina vagarosa e imita
A de uma elefanta.
E teu corpo pende e se aguça
Como escuna esguia,
Que às praias toca e se debruça
Sobre a espuma fria.
Qual uma inflada vaga oriunda
Dos gelos frementes,
Quando a água em tua boca inunda
A arcada dos dentes
Bebo de um vinho que me infunde
Amargura e calma,
Um líquido céu que se difunde
Astros em minha alma!
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