Um Sonho nos Sonhos de Einstein
Agosto 27, 2024
23 DE AGOSTO DE 2024
Sobre o alto das montanhas, a lua derrama um manto de âmbar que, gota a gota, pinga densamente sobre o vale. A luz fraca, que emana dos lampiões, dissolve o luar e esfiapa-se na neblina condensada pela madrugada. Quebrando a matéria negra, ou serpenteando as espaçadas partículas luminosas, odores doces – nascidos ainda na primavera – findam-se como espuma das ondas. Tudo num profundo silêncio, apenas quebrado, aqui ou ali, pelo breve latido de um cão longínquo.
No passeio, junto à estrada, um homem de meia-idade faz as últimas verificações à bicicleta e à mochila que, a custo, ergue até à curvatura das costas. Prepara-se para enfrentar a solidão e os desafios de mais uma viagem. A sua mente, que durante o ano nada mais é que o retrato desta noite, anseia as primeiras pedaladas. Precisa, pois, de vencer a inércia e dá início ao movimento. Com os primeiros metros, a trémula lanterna acoplada ao capacete, alumia a ambição de um destino, mas não é isso que verdadeiramente lhe importa. O que precisa é, tão-só, de um norte e estrada infinita para percorrer, até se cansar e não poder mais.
Neste mundo, quanto mais quilómetros o homem pedalar, menos tempo passará e mais tarde chagará a velhice. Pois, com a velhice, chegam as dores e a sonolência dos reflexos, os esquecimentos e as falhas de memória, o esquecer-se e o ser esquecido. Com a velhice, os sonhos – aqueles que ainda não se foram embora – esmorecem e degrada-se a esperança que os alimenta. Morrem os nutrientes da vontade de viver.
Nas suas infinitas dúvidas, o homem acredita que esta é apenas uma dimensão do Espaço-tempo e que há mais dimensões que estrelas visíveis no céu. Mundos com espaços e tempos próprios ou – quem sabe – impróprios. Diferentes configurações, com as suas regras e exceções, leis e transgressões. Cogita, nas suas inseguranças e ignorâncias, que todos estes mundos estarão em rota de colisão, rumo a uma singularidade. Um devorador, que dá pelo nome de Esquecimento.